sábado, 27 de novembro de 2010

Crie sua Revista ou Livro online

via http://www.nomundoenoslivros.com


Para que possamos criar um livro ou uma revista online de qualidade na internet, acredito que esta seja a melhor ferramenta que temos disponível.
O sistema Yudu permite enviar um pdf, áudio ou fotos para compor o material que nós estamos querendo criar.
O Yudu criará uma animação em Flash que permitirá aos seus leitores ler o conteúdo criado como se fosse uma revista de verdade, passando as páginas, recomendando a leitura a outros pelo


Vocês também podem criar um conteúdo que não seja gratuito e colocar um preço nele esperando que os leitores estejam suficientemente interessados como para pagar pelo acesso ao seu livro. Acho que você deve conhecer.


Muito bom mesmo!  http://www.yudu.com/

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Entrevista com Alexandre Oliva sobre copyleft, cibercrimes, cultura livre e software livre

por Manuela Andreoni
1. A Free Software Foundation alerta para o surgimento de diversas licenças em seu site, aconselhando as pessoas a saberem se existe alguma licença que supre suas necessidades antes de criar uma. O que você pensa da diversidade de licenças que existem hoje disponíveis? Desnorteadoras ou inspiradoras? Por quê?
Excesso de licenças cria um problema prático, particularmente para o software. Cada licença oferece um conjunto de permissões, sujeitas a algumas condições. Quando se cria uma obra derivada, como por exemplo um software que utiliza trechos de outros programas, modificando-os ou não, é necessário cumprir com as condições de todas elas. É comum que as condições entrem em conflito, de forma que, ainda que os autores dos programas utilizados não se oponham em princípio à modificação e à distribuição das obras derivadas, a combinação das permissões condicionadas resulta insuficiente para que isso seja permitido.
Infelizmente, as licenças de Software Livre disponíveis hoje não foram criadas com o cuidado para que fossem compatíveis entre si. De fato, lamentavelmente houve um tempo em que alguns grupos introduziram incompatibilidades intencionais, a fim de dividir a comunidade e minar a força da licença mais popular, que tem o copyleft mais forte: a GNU GPL.
2. Há diferença conceitual entre copyleft para softwares e obras artísticas?
Copyleft é um conceito que surgiu no software: é usar o poder de exclusão do direito autoral não para cercear as liberdades dos outros com relação a uma obra, mas sim para preservar essas liberdades, não concedendo permissão para distribuição de formas que cerceariam as liberdades.
O mesmo conceito pode ser utilizado para outros tipos de obras, mas pode variar o conjunto de liberdades consideradas essenciais. Para obras com finalidades práticas, que eu chamo de obras funcionais, como software, manuais, receitas, livros texto, as 4 liberdades do Software Livre se aplicam perfeitamente: a de acionar a finalidade prática da obra para qualquer propósito, a de estudar como ela desempenha essa finalidade prática e adaptá-la para que o faça de forma diferente, a de copiar, publicar e distribuir cópias da obra, e a de melhorar a obra, publicar e distribuir as melhorias. Há justificativas éticas, morais e sociais para cada uma dessas liberdades, assim como para o conjunto delas, no que diz respeito a software e outras classes de obras com finalidades práticas.
As mesmas ideias não se aplicam a obras destinadas a entretenimento. Estas não geram o mesmo tipo de dependência que as obras com finalidades práticas podem gerar, portanto nem todas as justificativas éticas, morais e sociais se aplicam. De fato, há quem defenda que as únicas liberdades essenciais para obras artísticas para entretenimento sejam as de apreciar e de compartilhar, isto é, distribuir sem fins de lucro. Já outros propõem uma analogia mais completa com as 4 liberdades do Software Livre, mas não se limitando a obras artísticas para entretenimento, estendendo a proposta a todas as obras culturais.
Dado esse embasamento, um copyleft para outros tipos de obras, isto é, um mecanismo de licenciamento que vise a não apenas respeitar, mas também a defender as liberdades essenciais, pode variar de um tipo de obra a outro, de acordo com a variação nas liberdades consideradas essenciais para aquele tipo de obra, mas conceitualmente é a aplicação da mesma técnica jurídica.
3. O que você pensa do Creative Commons? Qual é a sua importância?
Tenho opiniões divergentes a respeito. De um lado, é bom levantar questões de liberdades e respeito ao próximo para um público mais diverso que usuários de software, estendendo a discussão para outros tipos de obras culturais.
De outro, faltou ao Creative Commons por muito tempo uma fundação ideológica moral, ética e social para justificar as opções de licenciamento, não só do ponto de vista do conjunto de licenças disponíveis, como também do ponto de vista de orientação aos titulares a respeito de como escolher o licenciamento adequado para respeitar as liberdades essenciais em cada tipo de obra. Assim, limitava-se a oferecer um conjunto de opções de flexibilização das restrições estabelecidas pelo direito autoral.
Hoje, com a evolução do embasamento ideológico dos movimentos de Cultura Livre, Creative Commons descontinuou algumas das formas de licenciamento recomendadas anteriormente. Todas as licenças hoje recomendadas respeitam, no mínimo, as liberdades de apreciar e de compartilhar. Isso pode ser suficiente para alguns tipos de obras, mas certamente não para outros, como software. De fato, para software, o CC recomenda licenças que respeitam as 4 liberdades essenciais para software.
Falta ainda (e não só da parte do CC) chegar a algum consenso sobre as liberdades essenciais, para daí criar guias que as levem em conta para orientar autores no licenciamento ético de suas obras.
Chama-me a atenção uma distinção importante entre CC e SL, Software Livre. Embora nos dois haja toda uma gama de licenças disponíveis, no caso do SL todas elas têm como característica mínima respeitar as liberdades essenciais, enquanto no caso do CC, há licenças que não respeitam liberdades que muitos consideram essenciais para determinados tipos de obras, sem que CC deixe de recomendá-las. Isso é um ponto fraco.
Apesar de todos esses pontos, considero CC extremamente positivo, por levar a discussão aonde ela não estava. Meu maior receio era de que se perdesse a distinção entre tipos de obras, e que se acabasse por recomendar indiscriminadamente um licenciamento insuficiente livre para os tipos de obras com que mais me preocupo. Após algum realinhamento ideológico do CC internacional, esse receio já não mais existe, e fico feliz de recomendar o uso de licenças CC adequados a cada tipo de obra.
Mas ainda alerto contra a prática de dizer “sob licença CC”. Há no projeto tantas licenças, com características tão diferentes entre si, e praticamente sem nenhum ponto em comum, que “sob licença CC” não carrega o significado que se poderia esperar do termo “Commons”.
4. Quando discutimos copyleft, sempre caimos na questão “tudo bem, temos que aumentar o acesso aos bens imateriais, mas como fica o bolso dos autores?” Em relação ao software livre, diz-se que o dinheiro pode vir do suporte e de consultorias. De onde viria a renda dos artistas?
De onde sempre veio: shows, palestras, trabalhos desenvolvidos sob contrato, mecenato, venda direta ao consumidor ou a conjuntos de consumidores, e serviços associados às obras. Não é diferente do software.
O artista tem algo que ninguém mais tem antes da publicação de uma obra: a própria obra. Pode se recusar a entregá-la se não lhe pagarem o preço que pede. Claro que pode acabar não vendendo a obra, se ninguém estiver disposto a pagar o preço estabelecido, ou a formar um grupo suficiente para reunir o preço pedido. Se a sociedade como um todo não considera que a obra valha o que pede o autor, por que deveríamos oferecer-lhe uma maneira de conseguir o que quer?
Há que se lembrar que direito autoral surgiu não para privilegiar o autor, mas a sociedade. Ambos eram ameaçados pelo cartel constituído pela indústria editorial do século XVII/XVIII, quando máquinas de imprensa eram caríssimas, mas não havia empecilho legal para copiar ou publicar. A sociedade viu por bem buscar reduzir o poder desses cartéis, que compravam as obras dos autores por preços baixos, pois eles não tinham a quem mais vendê-las. Por isso conferiu aos autores um controle maior sobre a exploração das obras pelos cartéis. O objetivo era com isso incentivar a publicação de obras, cujos autores muitas vezes deixavam de publicar por não encontrarem condições favoráveis. O objetivo do incentivo à publicação era que, ainda que após um curto período de sacrifício da sociedade, todos passassem a poder se beneficiar da obra para sempre.
Não funcionou. A indústria conseguiu anular o poder conferido aos autores de obras literárias, pois eles ainda não tinham a quem mais vender as obras, e passou a se valer desse poder para coibir o uso pela sociedade dos avanços tecnológicos na imprensa. Depois conseguiu estender o mesmo modelo para obras musicais, audiovisuais, software e todas as demais criações do espírito. Passou a buscar estender o prazo de exclusividade, negando à sociedade o usufruto das obras. Passou a usar medidas tecnológicas para impor exclusividade até mesmo sobre os direitos que a lei excluía do sacrifício. E continua explorando os autores e a sociedade, agora não mais porque detém uma exclusividade quase natural dos meios de reprodução das obras, mas porque cria uma escassez artificial através de medidas jurídicas e técnicas, e tem poder suficiente para subverter a lei fazendo-a funcionar contra os interesses da sociedade, ameaçando o potencial de publicação e acesso democráticos que a tecnologia atual oferece.
5. O Partido Pirata é hoje o terceiro maior partido da Suécia. Ou seja, a questão do copyleft já inspira movimentos políticos oficiais. O que você pensa disso? Era esse um dos objetivos no momento da criação do novo tipo de licenciamento?
Não tenho conhecimento de que o Partido Pirata defenda o copyleft como se o entende na comunidade do Software Livre, onde surgiu esse conceito. Copyleft não é a anulação do copyright, é o *uso* do copyright em benefício da sociedade, e não de forma mesquinha. Mas, baseado no copyright (direito autoral), é ainda uma manifestação da vontade do autor, a quem a lei confere esse poder injusto.
A posição desse Partido, segundo a entendo e compartilho, é de que esse poder de exclusão é injusto e anacrônico, e deve ser anulado, ou ao menos severamente limitado, para deixar de servir a poucos em detrimento de quase todos, para servir ao bem comum, como deveria fazer toda lei.
Enquanto ele permanece, podemos criar e manter, através de recursos como copyleft, um corpo de obras culturais dos quais todos que quiserem podem se valer, quase como se não houvesse o direito autoral. Digo “quase” porque a natureza do copyleft é justamente condicionar esse valer ao respeito às liberdades essenciais: obras derivadas de outras obras copyleft, caso divulgadas, devem ser divulgadas sob os mesmos termos, de modo que acrescentem ao corpo de obras livres.
O Movimento Software Livre é um movimento de cunho político, não técnico, e o copyleft é uma inovação jurídica de profundo cunho social. A única surpresa que tenho é que essas ideias maravilhosas demorem tanto para ganhar larga aceitação popular. Certamente contribui para essa demora o controle dos meios de publicação e divulgação pela indústria editorial, antagônica a esses modelos democráticos e sem intermediários que a tornam obsoleta.
6. Quando inventamos alguma coisa, podemos colocar qualquer licença no que criamos, ou simplesmente colocá-la em domínio público. Posso escolher colocar minha obra em copyright e ter os direitos de sua comercialização até 70 anos depois da minha morte. Na Suécia, o Partido Pirata quer mudar isso, limitando a exploração comercial exclusiva da minha obra para cinco anos. O que você pensa dessa proposta. Acha que ela poderia se aplicar ao Brasil?
Deixa eu primeiro mencionar que “inventar” é um termo que tem a ver com patentes, que nada têm a ver com obras de direito autoral. Patentes têm a ver com uso exclusivo de ideias em aplicações industriais, enquanto direito autoral tem a ver com expressões de ideias (e não às próprias ideias), com a exclusividade em sua modificação, distribuição, publicação e execução pública. São não só conceitos diferentes, como também são reguladas por leis que nada têm em comum entre si. Não convém alimentar a confusão que a indústria editorial semeia empacotando essas duas e outras ideias na contraditória noção de propriedade sobre o imaterial, o não-rival, que pode ser compartilhado por multiplicação, ao invés de por divisão.
À pergunta. Quando, numa conferência sobre direito autoral, Richard Stallman (o pai do Software Livre e do copyleft) propôs a redução do prazo de exclusividade nos usos de obras autorais a 10 anos, um autor de ficção científica relativamente conhecido chamado Cory Doctorov protestou imediatamente: “É um absurdo! Qualquer coisa além de 5 anos é um roubo!”
De fato, as obras são exploradas comercialmente em prazos muito curtos, de um a dois anos, às vezes três, em raríssimos casos mais que isso. Cercear o uso da obra por mais 70 anos além da vida do autor é um contrasenso, ainda mais considerando que o objetivo do direito autoral era justamente trazer mais obras para o domínio público, para que todos as pudessem usar. Mas a indústria editorial, de alguma forma, consegue convencer legisladores a estender o direito autoral por mais 20 anos a cada vez que o primeiro filme com o camundongo Mickey está para cair no domínio público nos EUA. Como isso tornaria Walt Disney retroativamente mais criativo para fazer jus a esse incentivo adicional é uma dúvida que há muito me atormenta.
7. Qual é a posição da FSF em relação ao caso do PirateBay?
Isso é algo que você teria de perguntar à FSF. Sou ligado a uma organização irmã da FSF original, a FSF América Latina. Mesmo que sua pergunta se referisse à FSFLA, uma organização independente, não tenho autoridade para falar por ela, e não discutimos o assunto a ponto de termos uma posição consolidada.
De todo modo, pelo que conheço da posição ideológica de seus membros e das liberdades que defendemos, em todas as FSFes, não arrisco muito em afirmar que estamos todos em favor do livre compartilhamento.
8. Richard Stallman não gosta de se associar ao termo "pirata". Como você define a pirataria?
É a invasão de navios para roubar a carga e sequestrar, escravizar ou assassinar a tripulação. Nada parecido com copiar e compartilhar.
9. O que você pensa das licenças mais permissivas, como a "copie", criada pelo Partido Pirata Brasileiro? 
Não a conhecia. Adorei o protesto, mas não recomendaria seu uso, por ter sérias dúvidas sobre seu valor jurídico.
Por exemplo, ela não concede explicitamente permissão para distribuição, reprodução e derivação, que, pela lei de direito autoral, exigem permissão explícita do titular. Apenas estabelece condições para permissões que parecem não ser concedidas em lugar algum. Levando em conta que, segundo a lei, licenças de direito autoral devem ser interpretadas de maneira restritiva, temo que talvez a licença não tenha o efeito pretendido, o que é uma pena. Mas não sou advogado, apenas um estudioso do assunto.
10. A Lei Azeredo é vista pela maioria dos entendidos como um retrocesso. Qual seria a alternativa a ela para a inclusão da internet na legislação brasileira de forma mais atual e realista?
Não entendo a necessidade das alterações propostas no projeto. Dos crimes que o projeto confessa pretender prever, todos já estão previstos na lei vigente. Falsidade ideológica, fraude, estelionato e violação de segredo comercial e de privacidade já são crimes.
Estão chovendo no molhado tentando empurrar pra frente um projeto delineado a partir de um “acordo” assinado por uma dúzia de países ainda sob os ecos do 11 de setembro de 2001, para prever de forma redundante os mesmos crimes, enquanto tentam inventar jeitos de regulamentar o intangível, com consequências daninhas que negam.
O problema maior são os interesses inconfessáveis e a redação plena de problemas. Buscam atender aos interesses (i) dos bancos de empurrar para a sociedade os custos provenientes de transações eletrônicas fraudulentas, mantendo exclusivamente para os bancos as vantagens econômicas das transações sem receber os clientes nas próprias agências, e (ii) da indústria editorial, negando sempre que têm algo a ver com isso, exceto quando a verdade escapa em atos falhos.
Valem-se, para este último, de uma redação ambígua que torna um pedaço de papel um dispositivo de comunicação, sobre o qual se criminalizam a obtenção e a divulgação da informação nele contida, caso ocorra sem a concordância de seu titular. Mesmo que a informação seja pública, mesmo que seja obtida de outra fonte, mesmo que seja de interesse público. É o fim da liberdade de imprensa, a nova censura. Daí chamá-lo de AI-5 digital.
Estabelecem, ainda para promover esses interesses, um clima de terror e de vigilantismo através da violação paulatina da privacidade na Internet, substituindo redes abertas e democráticas por burocráticas redes vigiadas, antagônicas à inclusão digital. Para justificar esses abusos, não deixam de se valer da desculpa do combate à pedofilia, apesar de projeto de lei no mesmo sentido já ter sido aprovado nas duas casas do congresso nacional, um deles na mesma madrugada em que se aprovou o projeto Azeredo no Senado. É uma vergonha sem tamanho.
11. Você citaria o governo de algum país como tendo lidado melhor com a questão da internet na legislação?
A Internet não é um mundo à parte que exige legislação diferenciada. Os crimes são cometidos por pessoas reais, no mundo real: dinheiro é tomado, pessoas são ofendidas, informação sigilosa vai parar onde não era pra estar, e tudo isso já tem previsão em lei. Ninguém precisou redefinir todo o código penal quando inventaram o telégrafo, o rádio, o telefone ou o celular, para que fraudar, ludibriar, enganar, extorquir ou chantagear continuassem sendo crimes quando praticados através desses meios de comunicação. Por que seria diferente no caso das redes de computador?
Diversos países europeus têm tomado o caminho correto: privilegiar os direitos civis, os direitos humanos, as liberdades e a presunção da inocência, introduzindo leis de proteção à privacidade. Ao invés de condenar o provedor que não vigia seus clientes, condena aquele que coleta e armazena informação que identifique os clientes. Provedor não é polícia.
Já pensou condenar a companhia telefônica porque não grava todas as suas ligações, para o caso de a polícia precisar ouvir as ligações que você fez antes de alguém denunciá-lo por alguma suspeita de crime? É isso que estão querendo fazer no Brasil, só que não pras telefônicas, mas pra provedores de Internet, donos de cybercafés, administradores de sítios, telecentros, redes municipais e abertas.
E não é só porque você não está fazendo nada de errado que qualquer um, mesmo que seja da polícia ou tenha interesses comerciais enquanto provedor, pode sair vasculhando toda a sua vida digital. A privacidade é um direito de cada um, existem leis injustas sendo compradas por interesses contrários à sociedade, e a desobediência civil é um recurso legítimo e necessário para combatê-las.
E, assim como tem gente que se vale de ferramentas de informática para exercer liberdade de expressão e de imprensa para enfrentar ditaduras e escapar das garras de governos injustos, podemos um dia precisar novamente combater um governo autoritário por aqui. Se ele tiver o poder de um Grande Irmão (1984, George Orwell), que uma lei como essas tenta estabelecer, que faremos?
Vale lembrar que essas mesmas ferramentas hoje são usadas por aqui, tanto por quem quer legitimamente defender sua privacidade quanto por criminosos que se escondem da lei. O resultado do estabelecimento de uma lei como essas é que aqueles que têm seus computadores controlados por criminosos à distância, sem seu conhecimento ou consentimento, seriam acusados, transtornados e possivelmente até condenados por crimes que não cometeram, enquanto os verdadeiros criminosos continuariam à solta. Lei penal que pune inocente e deixa o criminoso livre é pior que lei nenhuma.
12. Quando abrimos qualquer coisa na internet, nosso computador cria umarquivo temporário para ela –– faz uma cópia. Ou seja, qualquer conteúdo protegido por copyright na internet tem sua licença sistematicamente violada. Pode o copyright sobreviver na internet? O copyleft seria a única resposta para esse problema? É possível conter os avanços contra o copyright?
Primeiro, deixa eu reclamar do termo “protegido”. Copyright não protege informação, ele a aprisiona. Informação é pra ser livre, até porque é um direito humano “procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”.
Além do mais, nem copyright nem direito autoral são um poder absoluto sobre as obras. Lembre que não é um direito natural, é uma concessão da sociedade, um sacrifício limitado e temporário. Também são direitos humanos “fruir as artes” e “tomar parte livremente na vida cultural da comunidade”.
Historicamente, direito autoral respeitou esses direitos humanos: nunca foi necessária permissão para apreciar uma obra cultural a que se tenha acesso, ou para compartilhá-la com seus amigos.
Nem bibliotecas nem ninguém precisa de permissões especiais para emprestar cópias de obras a quem queira, nem quem as empresta necessita permissão para poder apreciá-las.
Não é necessária permissão para fazer cópias temporárias de obras para apreciá-las depois; o direito de gravar programas de TV para assistir depois já foi reconhecido até nos EUA.
Não é necessária permissão para assistir a um DVD a que se tenha acesso, embora isso envolva inúmeros processos de decodificação, descompressão, cópia temporária e transferência entre dispositivos. Por que faria diferença se a tela está ao lado ou a quilômetros do computador que faz a leitura da mídia, seja o computador de propósito geral ou programado exclusivamente para executar DVDs? Essas cópias e transformações não são reguladas por direito autoral, são parte do processo de apreciação da obra, que é um direito humano de todos, não um direito exclusivo concedido ao seu autor.
A indústria editorial quer nos fazer crer que não temos esses direitos, a ponto de ir às escolas, com permissão de governos, para ensinar às crianças que compartilhar, que ser solidário com os amigos, é o equivalente moral de invadir navios, saquear sua carga e assassinar sua tripulação. Enquanto isso, nos rouba nossos direitos, nossa cultura, e usa o fruto do roubo para comprar legisladores e nos tornar criminosos.
Escrevi mais sobre esses e outros direitos humanos relacionados a obras culturais no sítio da Fundação Software Livre América Latina: http://fsfla.org/texto/copying-and-sharing-in-self-defense
Copyleft, estando apoiado no copyright, não é uma solução, é apenas um remendo que tenta tornar a vida num mundo contaminado por copyright menos intolerável. A solução ideal talvez seja extinguir o copyright, ou algo próximo disso, mas hoje já temos preocupação suficiente apenas tentando conter seu avanço sobre e contra os interesses da sociedade.

Valeu, Manuela!

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Latinoware apresenta programas que estarão disponíveis gratuitamente


Lúcia Nórcio - Agência Brasil - 11/11/2010
Software público
Três produtos que serão lançados na Conferência Latino-Americana de Software Livre, a Latinoware 2010, estarão disponíveis gratuitamente no portal Software Público, endereço eletrônico onde o governo brasileiro divulga programas de computador gratuitos, prontos para uso e compartilhamento com a sociedade e outros órgãos governamentais.
"Eles vão se somar aos 40 softwares já existentes e que contam com a participação de cerca de 180 mil usuários", disse Corinto Meffe, gerente de Inovações Tecnológicas do Ministério do Planejamento.
Uma dos programas foi desenvolvido pela prefeitura de Guarulhos (SP), que aproveitou a experiência do Provão do Ministério da Educação para criar a Provinha Brasil, que pode ser aplicada nas escolas municipais. A Latinoware 2010 está ocorrendo em Foz do Iguaçu (PR).
Software livre
Os softwares disponíveis no portal público são compilados pelo governo federal com a participação de municípios, empresas e universidades.
Segundo o gerente, essa parceria mostra que o modelo de software livre adotado pelo governo federal é robusto, confiável e capaz de alavancar oportunidades e de proteger os usuários. "Cada vez mais, as empresas estão nos procurando porque estão percebendo oportunidades de negócios no modelo de software livre do governo", disse Meffe.
A economia que as empresas fazem ao usar programas de computador que podem ser copiados, estudados, modificados e redistribuídos é difícil de ser medida. De acordo com Meffe, há custos para as empresas que adotam os programas abertos.
"Existem muitos dados agregados e o que temos percebido é que a ponta acaba absorvendo a informação de que todo o processo é gratuito. Isso não é verdade. É um modelo que vai exigir recursos com instalação, suporte e desenvolvimento. Tem economia de custo, mas as empresas precisam entender que estão adquirindo um modelo novo e que precisam cuidar para que ele funcione bem," alertou Meffe.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Livro digital traz experiências bem-sucedidas em agronegócio e desenvolvimento rural sustentável



Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) apresenta, por meio do Centro de Referência do Agronegócio Região Sul (Ceragro), o livro Experiências Recentes Bem-Sucedidas no Brasil em Agronegócio e Desenvolvimento Rural Sustentável. No primeiro capítulo, o IICAmostra um quadro descritivo da evolução do agronegócio nos últimos 30 anos no Brasil, buscando entender apenas as causas aparentes desse desenvolvimento.


A publicação destaca ainda seis experiências entre elas a atuação doInstituto Souza Cruz no desenvolvimento do Programa Empreendedorismo do Jovem Rural, voltado para jovens de 16 a 29 anos que tenham concluído o ensino médio, oferecendo formação e oportunidades para o desenvolvimento econômico e social dos jovens a partir do campo, valorizando suas potencialidades; e o Projeto de desenvolvimento das Cooperativas de Caju do Nordeste, formada exclusivamente por agricultores familiares, que comercializam castanhas de caju de alta qualidade, inclusive com certificação orgânica.



O livro destaca as experiências dos Programas de Fortalecimento da Agricultura Familiar; de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca; e de Desenvolvimento da Piscicultura.



A publicação está disponível somente em versão digital, em breve será apresentada em versão impressa.

Para fazer download do livro, clique aqui (2,58 Mb - arquivo PDF). 

FONTE: Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
via http://www.agrosoft.org.br

Links referenciados

Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
www.iica.org.br

Programa Empreendedorismo do Jovem Rural
www.institutosouzacruz.org.br/onewebms/s
ites/ins_66nfwq.nsf/fb0c4cf10fb002868025
6ad90058cf1e/c1256f4a004123e3c1256ebe003
1c52c?OpenDocument

Instituto Souza Cruz
www.institutosouzacruz.org.br

clique aqui
argus.iica.ac.cr:19555/Documents/Forms/D
ispForm.aspx?ID=682

IICA
www.iica.org.br

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

O conceito de Transmídia avança na literatura


Imagine um livro em que a história transpõe as suas páginas e expande para vários outros meios de comunicação, como TV, internet, rádio, telefone, etc. Imagine que a narrativa é construída de forma a ser acompanhada, simultaneamente, em outras mídias, que servem de suporte ao argumento central, ou a outras subnarrativas que se desenvolvem em planos paralelos. Pense nisso. Um romance cuja narrativa está espalhada por diferentes mídias, e que se completam fazendo com que o leitor acompanhe o enredo, ora lendo mais sobre um personagem num site, ora conhecendo detalhes sobre outro através do twitter, ou vendo no YouTube a “rua em que se passa o crime”, por exemplo. Isso é mais do que multimídia, é Transmedia Storytelling, ou somente transmídia, um formato que vem a galope não só na literatura, mas em quase toda a indústria de entretenimento. Não se trata de contar a mesma história em diferentes mídias, mas utilizá-las para complementar a história.

O escritor espanhol Fernando Marías lança hoje a obra juvenil “El silencio se mueve” (sem data para publicação no Brasil), um livro que já apresenta as primeiras ideias sobre a utilização da transmídia na literatura. A variada temática da obra de Marías, que inclui a relação entre pais e filhos, a morte, a memória histórica, pode ser acompanhada através de várias mídias. O leitor utiliza, além do livro, o site de Juan Pertierra, o protagonista da obra, mostrando como ele aprendeu com seu pai a escutar o silêncio, o que faz com que pessoas como Liza, uma mãe preocupada com o silêncio de sua filha, o chamem em busca de ajuda. A transmídia de Marías conta também com um blog do ilustrador Javier Olivares que investiga sobre a enigmática figura do ilustrador Joaquín Pertierra, pai do protagonista.

O número do telefone de Juan Pertierra também é fornecido. Quando o leitor liga, ele é convidado a visitar seu website para conhecer mais sobre seu dom, podendo deixar uma mensagem ao protagonista. O livro possui ainda, internamente, uma história em quadrinhos sobre a vida de Juan (40 páginas) e um guia de cinema para fornecer dicas sobre a história central. Embora a narrativa seja bem centrada no meio físico, as demais mídias complementam a história ajudando o leitor a desvendar os mistérios do protagonista. Como disse Fernando Marías ao jornal El Mundo: “…o romance pode ser lido e entendido sem um computador, pois a essência da história está no livro impresso, sendo o resto um bônus para enriquecer a narrativa”.  
As narrativas transmidiáticas devem ser encaradas como uma nova e grande oportunidade, pois utilizam tentáculos que se expandem por vários meios de comunicação de massa. No passado, pensava-se que um meio destruiria o outro, ou competiriam de forma canibalesca. Ledo engano, eles vão se completar cada vez mais, criando interligações narrativas que utilizarão desde o meio físico (o livro em si), passando por mídias em franca transformação, como a TV, até chegar ao imenso arsenal derivado da Internet. Como explicou Henry Jenkins, professor do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e autor da obra Cultura da Convergência (2009): “Uma história transmidiática desdobra-se através de múltiplas plataformas de mídia. Cada novo texto faz uma contribuição diferente e que valoriza o todo – de modo que uma história pode ser introduzida em filme, expandida através da televisão, livros e histórias em quadrinhos. (…) A leitura através de várias mídias sustenta uma perspectiva de experiências que motivam mais o consumo.” A convergência tecnológica e a transmídia serão utilizadas pelo cinema, pela TV (recentemente, a personagem Luciana da novela Viver a Vida, utilizou em cena um blog real, cujo acesso pelos expectadores foi um grande sucesso), em narrativas publicitárias e, claro, na literatura.
O romance de Fernando Marías, a primeira obra transmídia publicada na Espanha, explora o relacionamento entre mãe e filha, que envolve os mortos sem sepultura da guerra civil espanhola. Justamente essa parte da narrativa (que não é secundária no livro) se conecta a outros romances de Marías que tratam do tema (Cielo abajo e “Zara y el librero de Bagdad”). As diversas tramas paralelas funcionam como satélites gravitando em torno da trama original. Outro exemplo é a série Heroes, um megasucesso da TV que conta com a seção Heroes Evolutions em seu website. Nela o espectador encontra diversas histórias paralelas e desdobramentos do enredo que enriquecem o seriado, mas que não inviabilizam o entendimento de quem só o assiste pela TV.
Marías, 52 anos, várias vezes premiado (Prêmio Primavera de Novela, Prêmio Nacional de Literatura Infantil y Juvenil, Prêmio de Literatura Juvenil Gran Angular), diz que sempre gostou de correr riscos e que a ideia de “El silencio se mueve” é revolucionar a literatura juvenil. Não duvido. As portas estão apenas começando a se abrir para a transmídia e, com a explosão das redes de relacionamento, as possibilidades de sucesso são evidentes. Se o livro é bom, expandi-lo também será bom.
Kelly de Souza - é jornalista colaboradora da Revista da Cultura e Blog da Cultura. Compulsiva por literatura, chocolate e escrita - não necessariamente nessa ordem.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

As várias faces da (web) poesia - O uso da internet pelos novos poetas



Raquel Cozer 


Poesia em gif animado de Marcelo Sahea
***
As várias faces da (web) poesia
O uso da internet pelos novos poetas entra na reflexão sobre o gênero
Raquel Cozer – O Estado de S. Paulo
Questão inimaginável para gerações anteriores da poesia, o arquivamento da produção espalhada por sites, blogs e redes sociais hoje merece reflexão. Afinal, na década em que os diários virtuais se popularizaram no Brasil, boa parte dos versos disponibilizados online nunca chegou ao papel – um dos motivos pelos quais é tão pouco estudada a poesia feita na última década. “Torna-se difícil mapear a produção ciberpoética se não tivermos uma estratégia de preservação para arquivar o material que existe na internet”, diz o cearense Aquiles Alencar Brayner, curador do acervo latino-americano da British Library, no Reino Unido. Prestes a concluir mestrado sobre arquivos digitais, Brayner dará palestra a respeito na terceira edição do Simpoesia, encontro internacional que acontece do próximo dia 5 ao 7 na Casa das Rosas, em São Paulo.
O evento é apenas um dos sinais da atenção para este cenário num momento em que os e-readers começam a chegar a País, trazendo possibilidades de experimentação – assim como a literatura infantil, a poesia é um dos gêneros que mais têm a se beneficiar com as novas tecnologias. Nos dias 13 e 14, o festival literário Artimanhas Poéticas, no Rio – que incluirá apresentações de videopoesia e performances – levantará o debate A Poesia Escrita em Outras Esferas, com a estudiosa Heloísa Buarque de Holanda, organizadora da Enter Antologia Digital, e os poetas Gabriela Marcondes e André Vallias.
O encontro com a tecnologia é um fenômeno muito anterior à internet, embora tenha encontrado nela seu meio mais propício. O recém-lançado Poesia Digital – Teoria, História, Antologias (Fapesp/Navegar, R$ 30, 80 págs. + DVD), fruto de mapeamento realizado por Jorge Luiz Antonio, pós-doutorando no Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp, volta mais de 50 anos no tempo para encontrar as origens da poesia eletrônica. A primeira experiência do gênero, segundo o autor, foi publicada em 1959 pelo alemão Theo Lutz. Chamada Stochastische Texte, pegava as cem primeiras palavras de O Castelo, de Kafka, e criava novos textos a partir delas, usando um programa de computador que produzia frases na estrutura do idioma alemão. “Estava ali a origem dessa produção que tem forte relação com a arte, com o design e com a tecnologia, e que é um desdobramento das poesias de vanguarda, visual, concreta, experimental”, diz Antonio.
A poesia que se encontra na internet hoje permite enxergar pelo menos dois grandes grupos, embora eles não raro se confundam. “De um lado estão os herdeiros do concretismo, que ampliaram propostas idealizadas pelos irmãos Haroldo e Augusto de Campos e por Décio Pignatari”, diz Antônio Vicente Pietroforte, professor de letras, semiótica e linguística da USP (Augusto de Campos, por sinal, teve o primeiro contato com um Macintosh em 1984). “Outra vertente, que usa a rede mais como ambiente de difusão, tende a uma abordagem mais coloquial, influenciada pela música pop, pelos beats, pelos poetas marginais e pela literatura periférica.”
É nesse segundo grupo que está a maior parte da atual produção de poesia online no País – que, mesmo sendo tão ampla, permite o reconhecimento de alguns poetas, em especial ligados aos eventos literários. Caso da curadora do Simpoesia, Virna Teixeira, que estreou em 2004 o blog Papel de Rascunho  papelderascunho.net). Embora já tivesse sido publicada, foi depois da investida virtual que ficou mais conhecida pelo empenho em difundir a poesia e a tradução – ela comanda hoje um selo artesanal, o Arqueria Editorial. No blog, que recebe média de 200 visitas por dia, publica poemas próprios, mas também trabalhos de outros autores, imagens, frases e áudios, “como se fossem recortes”. “Hoje é mais fácil ter um livro editado, mas as casas tradicionais ainda resistem a lançar poesia. Quem faz isso são as pequenas, que têm distribuição limitada. A internet revelou um número de leitores muito maior do que se podia supor.”
A paulistana Adriana Zapparoli estreou o blog zênite (zeniteblog.zip.net), em 2004, três anos antes de publicar o primeiro livro, A Flor-da-Abissínia (Lumme). “Coloco lá textos referenciais de intenções líricas. Muitas das minhas publicações em revistas literárias impressas ou online são sugestões vindas da leitura do conteúdo do blog”, diz. O uso da tecnologia como linguagem, afirma, não lhe interessa. “Já me aventurei em recursos do gênero, mas prefiro a sensação perene da impressão, a coisa do papel. Gosto da textura, das cores, quase que um quadro”, diz. Vantagem maior da internet, para ela, é conhecer de perto o trabalho de poetas de outros países, algo hoje muito mais fácil do que foi para gerações passadas – a paulistana Ana Rusche, por exemplo, que organiza em São Paulo o evento literário Flap! e edita o blog Contrabandistas de Peluche (www.anarusche.com), chegou a ter livro publicado no México por conta de contatos feitos online. Experiência similar, mas dentro mesmo do País, viveu o poeta e tradutor Cláudio Daniel, editor da revista Zunái (www.revistazunai.com), uma das principais referências de poesia na internet. “Tenho 48 anos, mas só fui conhecer poetas da minha geração, como Frederico Barbosa e Arnaldo Antunes, pela rede. Foi só então que nossa geração passou a conversar e organizar revistas.”


Trabalho em animação de André Vallias

Recursos. Jorge Luiz Antonio lembra que mesmo a poesia focada no verbal sofre interferência dos meios tecnológicos. “Até a temática acaba influenciada pelas tecnologias, numa espécie de metalinguagem”, argumenta. Mas é entre os herdeiros dos concretistas que isso se destaca mais – em seu primeiro livro, Movimento Perpétuo, de 2002, o carioca Márcio André (www.marcioandre.com) chegou a usar códigos de HTML, com suas barras e tags, em meio aos versos, como conteúdo do texto.
André Vallias, editor da Errática (www.erratica.com), foi um dos pioneiros no Brasil no uso de computador em poesia – no início dos anos 90, quando os PCs ainda eram peça rara no Brasil, o jovem formado em direito teve contato, na Alemanha, com tecnologias que não existiam por aqui. “Nunca quis fazer poesia simplesmente escrita”, diz. Naquele momento, a divulgação era feita apenas por CD-ROM, limitação superada com a internet.
O interesse em explorar as possibilidades da web – em 1995, já produzia trabalhos em flash, com animação e áudio – o levou também a questionar o formato de revistas literárias online. “Muita gente fazia revista de poesia na internet, mas com o mesmo padrão da revista impressa. Ou seja, acumula uma série de trabalhos e faz por edição, a cada dois meses. Achava que essa limitação era inadequada”, conta. Fez da Errática uma espécie de blog com visual de site, tomando como base a revista Artéria – criada em 1975, com diferentes formatos a cada edição, chegou até a sair no formato de uma sacola, com os poemas de diferentes proporções dentro. “Aquela década foi muito fértil, com publicações impressas que superavam dificuldades. A Errática aplicou esse mesmo princípio na internet, sem obrigar cada trabalho a ter o mesmo padrão”, conta. Na última quarta-feira, entrou no ar a 101ª colaboração, um videopoema da carioca Gabriela Marcondes feito a partir de fragmentos de poesias de nomes como Cruz e Sousa, Florbela Espanca e Machado de Assis.
Performance. Assim como Vallias, o carioca Marcelo Sahea (www.sahea.net) dedica boa parte de seu trabalho à performance – uma espécie de caminho natural para o poeta que antecipa tendências e engloba gêneros. Autor de um e-book lançado em 2001, quando nem se falava no assunto, e que teve à época 15 mil downloads (no formato tradicional de PDF), hoje ele prefere apresentar sua poesia sonora ao vivo. Na avaliação de Vallias, essa tendência deriva das possibilidades virtuais – ler um poema ao mesmo tempo em que se ouve a voz do poeta, por exemplo. “A rede liberou a poesia da literatura. Há uma falsa impressão de que a poesia pertence à literatura, mas, na maior parte das culturas, a poesia oral é a fonte de perpetuação de mitos”, diz.
Uma entre os poucos estudiosos da poesia digital no Brasil, Heloisa Buarque de Holanda avalia que a crítica faz “pouco caso” das novas linguagens. “Como se vê mais quantidade que qualidade, imagina-se que não tem profundidade”, diz. Em 1998, o poeta e antropólogo Antônio Risério fez um estudo pioneiro desse trabalho, o Ensaio Sobre o Texto Poético em Tempo Digital. Doze anos depois, ele admite ter conhecido muito pouco “realmente digno de interesse”. “A maioria se senta diante do computador como se estivesse diante do papel e da velha máquina de escrever. Não se entrega ao novo meio. Os que fazem isso, como Arnaldo Antunes e André Vallias, vêm de antes da existência de blogs e revistas eletrônicas”, diz.
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Poema de Márcio André