segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Como o Brasil pode se preparar para Quarta Revolução Industrial


Economia e sociedade
A edição deste ano do Fórum Econômico Mundial, em curso em Davos, na Suíça, tem como tema central a chamada "Quarta Revolução Industrial".
O conceito descreve economia com forte presença de tecnologias digitais, mobilidade e conectividade de pessoas e de coisas, na qual o valor central é a informação.
Mas, será que o Brasil está preparado para essa nova revolução?
Segundo especialistas, o país se saiu bem na redução de desigualdade social na última década, mas precisa investir mais em educação e inovação para obter ganhos em produtividade e geração de empregos nesta nova economia.
"O grande desafio à frente é manter os avanços sociais e estimular o aumento da produtividade," afirmou Alicia Bárcena, secretária-executiva da Cepal (Comissão Econômica para América Latina e Caribe), órgão ligado à ONU.
Segundo ela, a transição passa por "novos pactos sociais": "É necessário construir novas alianças que transpassem partidos políticos e viabilizem condições para a criação de um novo ciclo de investimento. Integrar mercados regionais em tecnologias-chave, por exemplo com a criação de um mercado digital comum, e o incentivo a cadeias regionais de tecnologias e produtos verdes."
Investimentos em educação
O Brasil tem elevado o investimento direto em educação. No período compreendido entre a virada do milênio e 2013, o total cumulativo investido por estudante ao longo da vida acadêmica, do jardim de infância à universidade, passou de R$ 106 mil para R$ 162 mil. O aumento de mais de 50% tem base em dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), vinculado ao Ministério da Educação.
Ainda assim, o Brasil permanece abaixo da média dos países ricos, conforme retrata o Pisa, ranking internacional que avalia a qualificação de estudantes do mundo todo. No levantamento de 2012 foi observado que quase metade dos alunos brasileiros não apresenta competências básicas de leitura.
Além disso, outra análise da mesma organização, mas de 2015, estimou que os estudantes brasileiros são muito fracos na capacidade de navegar em sites e compreender leituras na internet, ficando à frente apenas da Colômbia e dos Emirados Árabes em um ranking com 31 países.
Revoluções Industriais
As três revoluções industriais anteriores tiveram início nos países desenvolvidos, chegando com atraso ao Brasil. A primeira foi a iniciada no fim do século 18, quando água e vapor foram utilizados para mover máquinas na Inglaterra. A segunda veio do emprego de energia elétrica na produção em massa de bens de consumo. A terceira é a do uso da informática, iniciada em meados do século passado.
A revolução atual, aliás, segue na esteira dessa anterior: é caracterizada por sua natureza hiperconectada, em tempo real, por causa da internet. Além das mudanças nos sistemas de produção e consumo e amplo uso de inteligência artificial, ela também traz o desenvolvimento de energias verdes, com menor impacto sobre o meio ambiente.
Mas a transição não necessariamente será suave.
Com essa nova etapa de conexão entre homens e máquinas, haverá uma quebra do modelo de cadeias produtivas e das interações comerciais em que os consumidores poderão atuar como produtores, na chamada Era das Máquinas Livres, fundada basicamente na impressão 3D, ou manufatura aditiva.
Nesse caminho, porém, mais de 7 milhões de empregos serão perdidos no sistema tradicional, segundo relatório do Fórum Econômico Mundial.
Brasil na Quarta Revolução Industrial
Como o Brasil poderia se preparar para esse momento?
"Idealmente, deveria implementar políticas de fortes incentivos que nivelem por cima, não apenas na área de formação e capacitação de trabalhadores para o uso de novas tecnologias, mas priorizando também investimentos em pesquisa e desenvolvimento para que o país não se torne um mero consumidor de tecnologias," sugere Vanessa Boana Fuchs, pesquisadora do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de St. Gallen, na Suíça.
Uma pesquisa realizada pela consultoria Accenture estima que a participação da economia digital no PIB do Brasil saltará dos atuais 21,3% para 24,3% em 2020 e valerá US$ 446 bilhões (R$ 1,83 trilhão).
O mesmo estudo aponta que o país precisa manter os níveis atuais de educação e expandir investimentos em novas tecnologias e na geração de uma cultura digital para acelerar ainda mais o progresso. Se o Brasil aplicar recursos ativamente nessas áreas, a consultoria prevê que o segmento econômico poderá movimentar outros US$ 120 bilhões (R$ 494 bilhões) além do previsto.
Neste mês, a presidente Dilma Rousseff sancionou o Marco Legal da Ciência e Tecnologia, novo parâmetro legislativo que promete reduzir a burocracia, facilitando investimentos em pesquisa e ciência nas iniciativas pública e privada. Além disso, o governo anunciou um edital de financiamento de R$ 200 milhões para pesquisa e desenvolvimento.
Ameaças da Quarta Revolução Industrial
Alicia Bárcena, da Cepal, vê três ameaças no horizonte da quarta revolução industrial: o aumento da desigualdade, as mudanças climáticas e a tendência recessiva das economias. Desafios, afirma, que podem ser solucionados com investimento estatal e políticas públicas ativas.
"Políticas fiscais expansionistas podem ajudar a evitar tendências recessivas e recuperar empregos. Acesso universal à educação e saúde encorajam demanda agregada e aumento de produtividade," defende. "Políticas sociais voltadas ao amparo social universal e no combate à desigualdade podem promover um incentivo crucial para a demanda minguante em todos os lugares."
Para a especialista, o investimento público deve ter um "componente ambiental" forte, que mova a economia mundial a um caminho de baixo carbono, ou seja, de baixa emissão de gases de efeito estufa. Essa alternativa, afirma, contribui muito mais para a geração de empregos do que a indústria poluente.
"O desafio é direcionar as novas e antigas tecnologias para a utilização mais eficiente de recursos naturais, energias renováveis e sustentável, cidades inteligentes que possibilitem evitar desperdício de energia e produção," avalia Vanessa Fuchs.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Quarta revolução industrial: A Era das Máquinas Livres

Para Joshua Pearce, o "faça você mesmo científico" está dando início a uma revolução: a era das máquinas livres, com software e hardware abertos. [Imagem: Sarah Bird/Michigan Tech]
"Faça você mesmo científico"
O movimento "Faça Você Mesmo" saltou das tarefas domésticas para os laboratórios de pesquisa.
E o salto foi impulsionado pelos mesmos motivos: economizar dinheiro e obterexatamente o resultado que você deseja.
Para Joshua Pearce, o "faça você mesmo científico" está dando início a uma revolução.
Três forças convergentes, todas de código aberto (open-source), estão por trás dessa revolução, explica o pesquisador em um artigo publicado no número mais recente da revista Science: software, impressoras 3D e microcontroladores.
Com essas ferramentas, pesquisadores de todo o mundo estão reduzindo o custo de fazer ciência, construindo seus equipamentos no próprio laboratório.
Arduíno
Tudo está sendo possível graças ao microcontrolador open-source Arduíno.
"A beleza desta ferramenta é que é muito fácil de usar," disse Pearce, que é professor da Universidade Tecnológica de Michigan. "Ela torna muito simples a tarefa de automatizar processos."
Veja como funciona.
O Arduíno - que é vendido por menos de R$100 no varejo - pode controlar qualquer instrumento científico, seja um contador Geiger, um osciloscópio ou um sequenciador de DNA.
Mas ele realmente brilha quando controla impressoras 3D, tais como a também de hardware aberto RepRap.
Esta engenhoca do tamanho de um forno de micro-ondas pode ser construída por menos de R$1.000, e pode construir suas próprias peças - uma vez que você tenha uma RepRap, você poderá construir tantas quantas queira. O laboratório de Pearce já tem cinco.
Impressoras 3D constroem objetos lançando camadas de plástico com espessura abaixo de um milímetro, umas sobre as outras, seguindo padrões específicos. Isso permite aos usuários construir equipamentos segundo suas próprias especificações, não ficando mais dependentes do que podem comprar no mercado.
O Arduíno controla o processo, dizendo à impressora 3D para fazer qualquer coisa, de um trem de brinquedo a um macaco de laboratório - não o animal, mas aquele equipamento de levantar coisas.
Faça parte da quarta revolução industrial: A Era das Máquinas Livres
A impressora 3D RepRap está sendo usada para construir equipamentos reais para uso nos laboratórios científicos. [Imagem: Pearce/Science]
Universo das Coisas
Macacos de laboratório levantam e abaixam equipamentos ópticos, mas não são radicalmente diferentes do macaco que você usa para trocar o pneu do carro.
O professor Pearce precisou de um em seu laboratório e, ao saber que o equipamento custaria milhares de dólares, resolveu projetar o seu próprio.
Usando uma RepRap, filamentos de plástico barato e algumas porcas e parafusos, Pearce e seus alunos construíram um por uma bagatela.
Então eles postaram o código OpenSCAD, que usaram para fazer seu macaco de laboratório, no Thingiverse, um repositório de projetos de código aberto, onde os membros da "comunidade de fazedores" podem enviar seus projetos para todos os tipos de objetos, e receber feedback.
"Imediatamente, alguém que eu nunca encontrei, disse: 'Isso não vai funcionar muito bem, você precisa fazer isso'," conta Pearce. "Nós fizemos uma mudança simples, e agora temos um macaco de laboratório que é superior ao nosso projeto original."
O Thingiverse - o "Universo das Coisas" (Things + Universe) - é um filho do movimento do software livre e de código aberto. Além de projetos para todos os tipos de objetos, ele pretende juntar milhares de mentes especializadas para resolver problemas. É a última palavra no trabalho em equipe, disse Pearce.
Faça parte da quarta revolução industrial: A Era das Máquinas Livres
O macaco de laboratório foi otimizado com a ajuda da comunidade de hardware aberto. [Imagem: Thingiverse]
Economia da doação
"Os movimentos do software livre e do hardware livre estão criando uma economia das doações. Nós pagamos para a comunidade submetendo nossos projetos, e recebemos pagamentos de volta na forma de um excelente feedback e acesso livre ao trabalho de outras pessoas. Quanto mais você dá, mais você recebe, e todos ganham nesse processo," disse ele.
A comunidade Thingiverse já tem uma linha completa de projetos com código-fonte aberto para mais de 30 mil "coisas".
E é tudo barato, o que traz em si a emergência dessa revolução.
Pearce relata que agora está ajudando seus estudantes a organizarem uma empresa cujos objetivos serão fazer projetos de código e hardware abertos para a indústria e construir instrumentos de laboratório sob medida para professores universitários, fornecendo tudo pronto por uma fração do custo dos equipamentos comerciais.
"Isso dará aos alunos as competências de que necessitam e lhes permitirá beneficiar toda a sua área de pesquisas," disse ele.
Faça parte da quarta revolução industrial: A Era das Máquinas Livres
Este equipamento permite construir trocadores de calor fundindo camadas de sacolas plásticas. [Imagem: Thingiverse]
Revolução da fabricação própria
Se a iniciativa se disseminar, milhares ou milhões de dólares que são gastos pelos laboratórios de pesquisa em todo o mundo para comprar equipamentos, agora poderão ser usados para dar apoio aos alunos.
Mesmo escolas de ensino médio poderão ter recursos para bons laboratórios de ciências. Mais pesquisas poderão ser financiadas com menos recursos, levando a mais descobertas.
"Usando hardware livre economizamos milhares de dólares para o nosso grupo de pesquisa, e estamos apenas esquentando os motores. Isso vai mudar a maneira como as coisas são feitas," disse Pearce. "Não há como parar essa revolução."
O endereço do Universo das Coisas é www.thingiverse.com, e uma boa forma de colaborar com essa nova onda seria que um grupo brasileiro se encarregasse de começar uma versão ".com.br" dessa "revolução das coisas".